Raquel Alves, consultora ambiental e advogada sócio-fundadora da AJA – Assessoria Jurídica Ambiental, entrevistou na sexta-feira Piercristiano Brazzale, Presidente da Federação Internacional de Laticínios e Vice-Presidente da BRAZZALE MORAVIA – uma das maiores, mais prestigiadas e mais antigas empresas produtoras de queijo e produtos lácteos do mundo, com produção em diversos países, como Brasil, Itália, República Checa e China.
O Grupo Brazzale é pioneiro em adotar medidas ecológicas e de sustentabilidade. Em 2010, criou a “Rede Eco-Sustentável Gran Moravia”, que estabelece regras rígidas de equilíbrio entre o meio ambiente e o bem-estar animal que os fornecedores devem cumprir em suas fazendas. Além disso, desde 2012 o Gran Moravia é o primeiro queijo do mundo a ter seu "Waterfootprint" calculado, indicando a quantidade total de água consumida em toda a cadeia produtiva, desde a matéria-prima até o produto acabado. Incrível, não é?
A entrevista foi maravilhosa! Além de extremamente simpático, o Piercristiano contou vários detalhes de como e por que o grupo Brazzale embarcou com tudo nos projetos de sustentabilidade até alcançar o extraordinário resultado de neutralidade de carbono para todas as atividades do grupo.
Desafios
Dentre os maiores desafios encontrados, nosso entrevistado disse que sem dúvida foi o desafio econômico. Ele justificou que a maioria dos investimentos em sustentabilidade requer uma grande alocação de capital financeiro e que, embora existam alguns programas de incentivo, as instituições financeiras são extremamente burocráticas, o que dificulta o acesso ao crédito.
Por isso, mesmo utilizando financiamentos bancários para muitos de seus projetos ambientais, esses financiamentos/empréstimos quando solicitados junto aos bancos não eram vinculados à sustentabilidade junto às instituições.
Sustentabilidade x Benefício econômico
Piercristiano é enfático ao afirmar que investir em sustentabilidade está extremamente relacionado com investir em otimização e tecnologia. Com essa combinação o resultado não pode ser diferente: aumento na produtividade, redução de custos e melhoria na qualidade do meio ambiente como um todo.
Ele nos conta com orgulho, que em 2015 fez um investimento de cerca de 500 mil euros num sistema de conversão de energia através do metano, e que com esse investimento conseguiu atingir uma redução anual nos seus custos relacionados à eletricidade de mais de 150 mil euros.
O Grupo de laticínios Brazzale é o primeiro a atingir a meta de neutralidade de carbono, e a singularidade de seu modelo está em ter alcançado essa neutralidade por meio de um crescimento de produção e produtividade de quase três vezes mais.
Ele afirmou que o investimento nos sistemas de produção inovadores possibilitou esta conquista, além disso, melhorias formidáveis em termos de bem-estar animal, biodiversidade, economia de recursos naturais e econômicos, qualidade e salubridade do produto.
Não deixa dúvidas de que vale a pena investir em sustentabilidade, não é mesmo?
Ainda assim, perguntei o que ele acha que impede outros empreendedores de fazer o mesmo. Piercristiano nos conta que a maioria dos outros produtores quando indagados sempre respondem que no momento têm outras “prioridades de investimento”, e que lhes falta uma visão mais ampla dos benefícios a longo prazo.
Perguntei, ainda, se o Grupo utiliza algum framework para gerenciar os investimentos ambientais, e ele disse que não. Em síntese, a alocação de recursos dentro da empresa para os investimentos de impacto ambiental está totalmente relacionada com o investimento no crescimento do grupo, melhora na produção, redução de custos e consciência ecológica, que trouxeram não apenas um benefício econômico, como também um benefício ambiental e social.
Brazzale no Brasil
Uma das empresas do grupo é a “Agropecuária Ouro Branco”, localizada em Mato Grosso do Sul, onde o grupo desenvolveu um sistema de integração Lavoura-Pecuária-Floresta, o sistema Silvipastoril.
A implementação do sistema Silvipastoril na propriedade proporcionou o reflorestamento de pastagens e sua transformação em “pulmões gigantes” que captam CO2, graças a 1,5 milhão de eucaliptos que foram plantados na fazenda, cerca de 300 por cada cabeça de gado, plantados em fileiras, recriando floresta e clareiras, ideais para o gado.
O reflorestamento das áreas de pastagem permitiu para o grupo Brazzale o alcance de outras metas extraordinárias:
- Aumento do bem-estar animal, pois um ambiente natural de floresta e clareiras é recriado
- Aumento incrível da biodiversidade
- Aumento da produção de forragem e carne por unidade de área
- Eliminação de fertilizantes
- Redução da necessidade de solo (desmatamento).
Política
Questionado sobre a política brasileira, Piercristiano elogiou o trabalho da Ministra de Agricultura, Tereza Cristina. Disse que o Brasil se preocupa mais com as questões ambientais do que muitos outros países, incluindo alguns países da Europa. Que infelizmente existe uma falha do Brasil na comunicação externa/internacional em relação às questões ambientais, o que por muitas vezes acaba prejudicando os setores que investem em sustentabilidade.
Querem saber os números?
Em detalhe, estas são as emissões das nove fábricas do Grupo (ano 2018):
Emissões totais: 45.431 toneladas Co2 eq / ano
a) 14.139 de origem biogênica
b) 31.292 de origem fóssil
Absorção total: 54.110 toneladas Co2 eq / ano de origem biogênica.
O grupo Brazzale, portanto, consegue ser “Carbono Positivo”, pois possui uma maior “absorção” de CO2 em mais de 8.600 toneladas Co2 eq / ano a mais do que suas emissões. O inventário de Ghg (gases de efeito estufa, incluindo CO2) foi verificado por Dnv Gl.
Conclusão
Quando o assunto é sustentabilidade ainda existem vários tabus e fantasmas que ficam sondando a cabeça de muitos empreendedores por aí. O Piercristiano nos mostrou que investir em sustentabilidade está totalmente relacionado com eficiência, redução de custos e melhoria na qualidade sócio-ambiental, e que consequentemente o retorno financeiro vem!
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